Soraya Smaili, Maria Angélica Pedra Minhoto, Pedro Arantes, Larissa Roso
A Universidade de Harvard, a mais prestigiosa instituição de educação superior norte-americana, desponta como protagonista no atual front de batalha do presidente Donald Trump contra a educação e a pesquisa. Um processo cujo início surpreendeu, e cuja resposta de coragem é exemplo diante da perseguição antidemocrática.
O confronto envolve não apenas cifras bilionárias, mas também, e principalmente, uma parte da guerra que visa a eliminar a autonomia e a liberdade de expressão das universidades. A história mostra que instituições de educação foram sempre objeto do desejo de controle ou de destruição por parte de governos autoritários, desde os tempos obscuros, como na Idade Média, até os tempos modernos, com o nazismo e o fascismo.
A administração de Trump começou com a crítica a instituições acadêmicas em relação a atos que considerou antissemitas em protestos contra a destruição de Israel na Faixa de Gaza. O segundo mandato do republicano exige que universidades proíbam a admissão de estrangeiros “hostis aos valores americanos”, reformulem cursos e, indo além, encerrem programas relacionados à diversidade, à igualdade e à inclusão.
Ao completar 100 dias de governo, tudo indica que Trump tem o objetivo de acabar com 100 anos de desenvolvimento da ciência e tecnologia. Mas Harvard se negou a ceder e a cumprir com as demandas, mostrando o que uma verdadeira universidade pode e deve fazer. “Nenhum governo deveria ditar o que universidades privadas podem ensinar”, reagiu o reitor, Alan Garber. É óbvio que para isso é preciso ter autonomia, o que Harvard certamente tem.
Em represália, o Departamento de Educação congelou US$ 2,2 bilhões (em torno de R$ 12,5 bilhões) em recursos. A universidade ingressou com uma ação judicial contra a Casa Branca, sob o argumento de que as intenções de “coação e controle” violam as proteções constitucionais para a liberdade de expressão. Centenas de faculdades e universidades, como Yale, Brown e Princeton, assinaram uma carta que dá o tom da indignação suscitada com o que classificam como “intrusão”: “Nós nos manifestamos em uma só voz contra o controle governamental sem precedentes e a interferência política que agora colocam em risco o ensino superior”. Uma reação que traz esperança a todas as universidades do mundo.
No Brasil, vivemos algo semelhante em um passado não muito distante, quando um governo ameaçou e achincalhou as universidades e a ciência. Conseguimos resistir, mesmo diante de uma pandemia na qual fomos centrais na busca do conhecimento e para salvar vidas do negacionismo. A função da universidade, em seu caráter mais elevado, é exatamente criar um ambiente em que o conhecimento possa suplantar a ignorância e a barbárie.
Essa postura combativa inspirada pelo levante de Harvard deverá ser o motopropulsor que desnudará e superará as contradições e a devastação das ideias. Ao longo de séculos e diante de tantos ataques, as universidades mostram que podem resistir em nome do conhecimento, ao contrário dos governos e dos governantes supremacistas e destruidores. O pensamento e a ação serão sempre os elementos-chave para a sociedade democrática
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