Pedro S. Teixeira
Quando o então engenheiro do Google Orkut Büyükkökten resolveu fundar a rede social de próprio nome, a maioria dos chamados internautas se comunicava por email, em programas de mensagem como o Messenger e o ICQ ou em chats temáticos como o mIRC e o Bate-Papo UOL.
Um turco radicado na Alemanha que se graduou na Universidade Stanford, nos Estados Unidos, Büyükkökten disse à Folha que “queria criar uma rede online para ajudar as pessoas a fazer amigos a partir dos amigos dos amigos”. Aos 28, ele tirou o plano do papel em janeiro de 2004, quando a internet comercial no Brasil se encaminhava para o nono aniversário (neste ano, completa 30 anos).
Além dos amigos dos amigos, o slogan da plataforma fazia menção às comunidades, que também reuniam desconhecidos com interesses afins para discutir. Os usuários podiam deixar recados uns para os outros e guardar um número limitado de fotografias, como em um fotolog (um blog de fotografias).
Essa receita garantiu uma explosão de popularidade à plataforma de Büyükkökten e foi a maior rede social do mundo até 2011, quando o Facebook assumiu a liderança. Os brasileiros eram a maioria no site de 100 milhões de usuários, somando 30 milhões de pessoas.
O engenheiro turco recorda com nostalgia do sucesso no país, que visitou neste ano para participar de um evento de tecnologia em Porto Alegre. “Com o Brasil, eu acho que a cultura é similar à que eu cresci, as pessoas são muito amigáveis, apaixonadas e há tanta comunidade, e todos esses valores estavam refletidos no Orkut.”
Para ele, esse modelo de rede social chegou ao fim porque as plataformas não conectam mais as pessoas. A teia de contatos que interligava as pessoas fora, ao longo dos últimos anos, foi substituída pela mediação de algoritmos feitos para eleger o que chama atenção do público. “Nos primeiros dias de Orkut, chamávamos de rede social e agora chamamos de mídia social.”
Por isso, a dinâmica de circulação de conteúdo passou a se parecer mais com a de uma transmissão em massa, como a televisão e o rádio. “Agora, nós não lemos jornalistas ou assistimos às notícias, e sim ouvimos influenciadores, que são pessoas que têm muitos seguidores”, afirma o pioneiro das redes sociais.
Apenas são ouvidos e vistos, avalia Büyükkökten, os grandes perfis, e a pressão para crescer faz as pessoas publicarem conteúdos exagerados. “O que cria mais renda? Mais engajamento, mais tempo gasto na plataforma, viralização, essas são coisas que a empresa pode medir e planejar”, acrescenta.
“Eles estão transformando nossa atenção em narcisismo, nossa amizade em moeda, e a intimidade em um teatro de espetáculos”, acrescenta o pioneiro das redes sociais.
A rede social Orkut, assim como as plataformas de hoje, tinha no marketing digital a principal fonte de renda —o site tinha banners e as marcas mobilizavam campanhas dentro da rede. Ainda não havia, no entanto, a dinâmica de publicações impulsionadas que ganhou mercado com o Facebook.
O cearense Afonso Alcântara começou a carreira, há quase 20 anos, fazendo campanhas para o Orkut. Hoje, ele passou a oferecer uma promessa de alternativa da atual dinâmica das redes sociais ao fundar Poosting —uma plataforma brasileira que soma traços do Orkut, do X (ex-Twitter) e do Instagram.
A solução de Alcântara, entretanto, não é regressar ao grafo social (a teia de contatos) ou acabar com os influenciadores. Ele quer equalizar a circulação de todas as publicações. Com 1,5 milhão de usuários cadastrados, o Poosting torna cada publicação em um disparo que chega a todos os usuários.
“Se você publicou agora, quem estiver online e chegar a tempo no feed cronológico vai ver a sua publicação sem a necessidade de receber um monte de likes na publicação”, explica.
Parece bagunça, mas há regras: as publicações, ordenadas cronologicamente, desaparecem depois de 24 horas. O número bem menor de pessoas online também evita a sobrecarga na linha do tempo —de acordo com Alcântara 15% das 1,5 milhão de contas frequentam, de fato, a plataforma.
Ainda segundo Alcântara, essa dinâmica subverte a autoridade do influenciador. “Já houve casos de influencers que entraram na plataforma e não se deram tão bem porque o negócio deles era ali uma foto na praia, aquela coisa toda, mas o forte da Poosting é a interação, a comunidade”, afirma.
O site oferece comunidades, aos moldes do Orkut —chats temáticos nos quais as pessoas podem debater. Há casos em que o nome é igual ao de uma antiga comunidade no Orkut, como em “00h01 e a insônia”.
A startup, porém, manteve a dinâmica de seguidores e de outros traços das redes sociais contemporâneas. A plataforma dá a opção de se tornar aliado (como se fosse um seguidor) de outras contas e disponibiliza uma linha do tempo apenas com as publicações dos aliados.
No médio prazo, caso o feed dos aliados ganhe popularidade, a medida pode separar as contas com muito alcance das contas com baixo alcance, apesar da proposta de igualdade.
Além disso, desde três de abril o site passou a aceitar pagamentos para impulsionar a circulação de publicações e ficou ainda mais parecido com seus pares como X, Facebook, Instagram, TikTok entre outros. Tal qual as outras plataformas, o Poosting nasceu com investimento de risco e precisa se tornar sustentável financeiramente no futuro.
Para Büyükkökten, conectar o valor da plataforma ao engajamento é uma receita fadada ao fracasso. “O que cria mais engajamento é o ódio, a raiva e o conteúdo polarizado, e todos os algoritmos são otimizados para engajamento.”
A aposta dele é voltar às interações entre amigos de amigos, ele tem um projeto de uma nova plataforma, mas disse que ainda não há nomes para divulgar.