Por: Giuliana Miranda
Pesquisadores espanhóis afirmam ter revelado a verdadeira origem de Cristóvão Colombo, tema que é motivo de controvérsia há séculos e já suscitou dezenas de teorias. De acordo com um novo documentário, exibido em horário nobre pela RTVE (emissora pública), análises de DNA teriam identificado que o famoso navegador era um judeu sefardita.
A investigação, liderada pelo médico legista José Antonio Lorente, professor da Universidade de Granada, durou mais de 20 anos e foi apresentada na noite de sábado (12).
As afirmações feitas na produção, contudo, foram recebidas com ceticismo por parte da comunidade acadêmica na própria Espanha.
Cientistas destacaram que as conclusões apresentadas sobre a origem de Colombo não foram publicadas em um artigo científico, não tendo havido, portanto, o escrutínio do sistema de avaliação por pares. Houve ainda quem criticasse a falta de aprofundamento em aspectos técnicos sobre a análise do DNA do explorador.
“Infelizmente, no campo científico nenhuma avaliação pode ser feita após a visualização do documentário, pois ele não oferece um mínimo de informações sobre o que foi analisado”, disse o geneticista Antonio Alonso, ex-diretor do Instituto Nacional de Toxicologia e Ciências Forenses da Espanha, em entrevista ao El País.
“A minha conclusão é que o documentário não mostra o DNA de Colombo em nenhum momento, e os cientistas não sabem que análise foi feita”, completou.
Em entrevista à mesma publicação, e também nas redes sociais, outros pesquisadores também se mostraram pouco convencidos com a produção, lançada justamente no feriado nacional que comemora o dia da hispanidade.
Líder do trabalho agora apresentado, além de protagonista e narrador do documentário, o professor José Antonio Lorente afirma que o material será publicado em um periódico científico futuramente.
Até agora, a teoria mais aceita é a de que Colombo —que liderou expedições marítimas financiadas pela Espanha, abrindo caminho para a exploração das Américas pelos europeus— era da região de Gênova, na Itália.
Ainda assim, várias circunstâncias sempre fizeram com que esse fato fosse questionado, sobretudo em outras nações “candidatas” à terra natal do explorador, que morreu em 1506 em Valladolid, na Espanha.
Entre as diferentes teorias para suas origens estavam Suécia, Noruega, Portugal, França, Inglaterra, Escócia, Hungria, Irlanda e Croácia, além de diferentes regiões do território espanhol, como Galícia, Catalunha, Valência, Navarra e Maiorca.
Para os espanhóis, um fato que indicava a sua origem no país era o idioma utilizado pelo navegador em suas cartas: sempre o castelhano.
No documentário, Lorente e seus colaboradores indicam que analisaram em detalhes o material genético de Cristóvão Colombo e de seus familiares, havendo “no DNA mitocondrial e no cromossomo Y de seu filho Fernando Colombo traços compatíveis com sua origem judaica”.
A conclusão, que teve participação também de um time multidisciplinar de pesquisadores, incluindo historiadores e especialistas em genealogia, indicou que o perfil genético encontrado é do Mediterrâneo ocidental.
Outros elementos, como a questão do idioma, teriam permitido limitar a origem do navegador à porção espanhola da região.
O trabalho de investigação das origens começou em 2001, quando o historiador Marcial Castro propôs a Lorente que fosse aberta a tumba, na catedral de Sevilha, onde estariam os restos mortais do explorador, para verificar sua autenticidade.
Na República Dominicana, também há um túmulo atribuído por fontes locais ao explorador. Portanto, a etapa inicial era essencialmente validar onde, de fato, estava Colombo.
Embora inicialmente o grupo de José Antonio Lorente tenha afirmado que os restos mortais da Catedral de Sevilha pertenciam ao navegador, a pesquisa acabou paralisada, em 2005. No documentário, o líder do projeto afirma que isso se deveu ao estado da tecnologia naquela altura, que era incapaz de extrair a informação necessária do DNA dos escassos fragmentos disponíveis para a investigação.
O avanço científico, contudo, permitiu a retomada dos estudos em 2020.
A produção argumenta que Cristóvão Colombo deliberadamente se esforçou para esconder suas origens judaicas, uma vez que, no século 15, havia uma forte perseguição à religião na Inquisição promovida pela Igreja Católica.
O filme sugere que Cristóvão Colombo possa ter recebido auxílio de outros judeus para convencer os reis espanhóis a patrocinarem sua empreitada de tentar chegar à Índia.
“Judeus e judeus convertidos o ajudaram, entre eles o duque de Medinaceli, com quem viveu vários anos. Ministro das Finanças do rei Fernando, o Católico, e que financiou pessoalmente a expedição à América, dando grande apoio a Cristóvão Colombo”, disse o arquiteto Francesc Albardaner, ex-presidente do Centro de Estudos Colombinos de Barcelona e autor de um livro que explora possíveis origens catalãs do navegador.
Segundo o documentário, na época do explorador, a atribuição do sobrenome Colombo (Colón, em espanhol) era comum a órfãos e a crianças com origens familiares desconhecidas na região onde hoje fica a Itália. Por isso, argumenta a produção, a utilização do sobrenome seria o disfarce ideal para alguém que quisesse dissimular sua verdadeira origem.
Os testes de DNA também teriam revelado que Cristóvão Colombo mentiu sobre suas relações familiares. Segundo o documentário, Diego Colombo, apontado como irmão do explorador, era na verdade um parente mais distante, como um primo de segundo grau.
Em meio à avalanche das novas e polêmicas afirmações, muitos membros da comunidade científica espanhola seguem afirmando que ainda é preciso cautela, sobretudo porque o estudo que sustenta o documentário ainda não foi publicado.
Em declarações ao El País, Lorente disse que a nova produção “não é um documentário científico, mas um filme” baseado em seus estudos. Ele afirmou que os resultados científicos serão apresentados em uma coletiva de imprensa, provavelmente no fim de novembro, e que, até lá, não fará mais declarações.