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Não há dúvida de que a carga tributária brasileira, além de excessiva para um país de renda média, é mal distribuída, tanto do ponto de vista da eficiência econômica quanto da justiça social. São bem-vindas, assim, propostas bem estruturadas para elevar a progressividade do sistema —evitando, em especial, que os mais ricos escapem da devida taxação.
É o que deveria ocorrer na esperada reforma do Imposto de Renda das pessoas físicas (IRPF) e jurídicas (IRPJ), pauta a ser tocada com a conclusão de outra grande mudança do sistema, a que abarcou os tributos indiretos sobre bens e serviços.
Começa muito mal, porém, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quando subordina o início do debate à promessa eleitoreira de isentar vencimentos mensais até R$ 5.000 —muito semelhante a outro desvario apresentado antes por Jair Bolsonaro (PL).
A depender do critério usado, tal medida implicaria renúncia anual entre R$ 35 bilhões e o dobro disso ou mais, montante que precisaria ser compensado no Orçamento, seja por determinação legal, seja para evitar um déficit público ainda mais exorbitante.
Até onde se sabe, a partir de indicações da Fazenda, a contrapartida seria uma cobrança mínima entre 12% e 15% sobre rendas superiores a R$ 1 milhão ao ano, incluindo salários, juros, dividendos e outras fontes. Estimativas extraoficiais apontam para uma coleta de ao menos R$ 44 bilhões de cerca de 250 mil pessoas.
Já Lula prefere demagogia explícita. Em entrevista, saiu-se com a velha tese sindicalista de que salário não é renda e disse que quem deve pagar imposto é “o cara que vive da especulação”.
Uma reforma do IR é tarefa econômica e politicamente delicada. A última tentativa, sob Bolsonaro, transformou-se em uma mixórdia felizmente não concluída pelo Congresso. São evidentes, desde já, deficiências nas ideias que emanam do governo petista.
A faixa de isenção do IRPF cogitada é alta em demasia, perto do dobro do rendimento médio da população ocupada. Segundo dados do IBGE para 2023, 90% dos trabalhadores do país tinham renda até R$ 5.603.
Também há que considerar os que ganham entre R$ 60 mil e R$ 1 milhão anuais, que não fazem parte dos isentos nem dos “milionários” visados. Não se entende ainda como as alíquotas seriam redistribuídas nessa faixa com proporcionalidade e sem grande perda de arrecadação.
Não é desejável, ademais, desvincular as reformas do IRPF e do IRPJ. Nesta, um caminho lógico seria reduzir a carga de 34% sobre o lucro das empresas maiores em troca da cobrança sobre dividendos, hoje isentos —o que se associa exatamente à ideia de taxar os mais abonados.
Em qualquer hipótese, um projeto para redesenhar o IR precisa estar amparado em projeções sólidas de receita e em lógica tributária. Se começar por uma invencionice eleitoreira, dificilmente sairá menos ruim do Congresso.