Se você gosta dos vinhos de Chablis, brancos com perfil marcante feitos no norte da Borgonha, sugiro que os aproveite bem. As mudanças climáticas têm sido um grande desafio para os produtores, que lutam de diferentes maneiras para controlar os efeitos do calor que ameaçam o perfil da bebida.
A região sempre lidou com geadas, que não causavam danos quando aconteciam na dormência da planta, no inverno. Hoje, a brotação tem vindo mais cedo e as geadas podem destruir plantinhas que seriam, meses depois, lindos (e valiosos) cachos de uva. Produtores têm gastado rios de dinheiro com métodos que envolvem cabos elétricos para esquentar as plantas e helicópteros que sobrevoam vinhedos para fazer o ar circular. Há até quem esteja renunciando ao cultivo orgânico para conter outros problemas trazidos pelo calor, como fungos e pestes, ou iniciando criações de animais para comer pragas.
Mas há o outro lado da moeda: o aquecimento global, no ponto em que estamos, tem favorecido a maturação da uva, ainda que o cenário peça sabedoria dos viticultores para a hora certa da colheita (que tem ocorrido mais cedo). E tudo isso num momento em que a marca Chablis é considerada uma das mais poderosas do mundo do vinho. A região, nos últimos dez anos, passou a compor o soft power francês: está para o vinho assim como Truffaut para o cinema ou Dior para a moda.
Uma explicação é que as vinhas de Chablis, que nasceu como denominação de origem em 1938, ficaram mais velhas e, logo, têm produzido com mais qualidade, explica Anne Moreau, executiva do Bivb (Bureau Interprofessionnel des Vins de Bourgogne).
Se a Borgonha é um mar de especificidades para deixar qualquer nerd do vinho de cabelo em pé, a sub-região é um bálsamo: faz vinhos brancos com chardonnay, tem quatro níveis de qualidade (do Petit Chablis ao Grand Cru) e um perfil sensorial muito característico, fruto de um terroir único.
É muito fria e com exposição solar tímida, o que garante a tal acidez viva. É também dotada de solo calcário, onde antes existia um mar cheio de ostrinhas em formato de vírgula, chamado kimmeridgiano, que guarda fósseis e lembra giz.
Essa lembrança de giz entra na taça e é sua assinatura, assim como a cor amarelo-esverdeada, a salinidade e as notas cítricas. Uns vinhos são mais elétricos, outros mais untuosos.
Só ano passado, no Brasil, os vinhos da Borgonha tiveram alta de 17,5% em volume sobre 2023. Os destaques foram Chablis e Petit Chablis. De todos os vinhos brancos franceses consumidos no país, 74,3% vêm da Borgonha.
Os números justificam a chegada ao eixo Rio-SP da campanha de promoção da região, nesta semana, com a presença de Anne Moreau. Se você nunca provou um Chablis na vida, ela recomenda: comece pelos mais simples (Petit Chablis) e escolha pelo produtor. Meu complemento: prepare o bolso.
Vai uma taça? No Brasil, infelizmente não se encontram garrafas de Chablis por menos de R$ 200, então pedir uma taça em restaurantes é uma saída. Para quem pode gastar mais, o Chablis Domaine Race (R$ 265 no Altruísta Osteria e Enoteca) e o Domaine des Quatre Saisons Chablis Calcarius (R$ 299 na Toque de Vinho) valem. William Fèvre e Joseph Drouhin são dois grandes produtores, importados, respectivamente, pela Grand Cru e pela Mistral. Para premier cru, vale ver a oferta da De la Croix.
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