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Assim como as pessoas, as instituições têm apelidos. No caso do STF (Superior Tribunal de Justiça), por julgar aspectos da vida cotidiana dos cidadãos, sua alcunha é Tribunal da Cidadania. Mas nem sempre a Corte é sensível às limitações cognitivas de tais cidadãos. No julgamento do Tema 1124, a corte precisará ser para lá de cidadã para honrar seu apelido.
O STJ analisará dois aspectos. O primeiro é se o cidadão que busca se aposentar ou revisar benefício será barrado no Judiciário pelo simples fato de ter feito pedido administrativo no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) malfeito ou faltando algum documento. Caso superado este ponto, a Corte resolverá se este mesmo cidadão será penalizado financeiramente ao deixar de receber parcelas retroativas, já que “sua falha” enseja que o início dos efeitos financeiros comece a partir da citação do INSS no processo judicial, ao invés do requerimento administrativo.
Uma das finalidades do INSS é assegurar o pagamento de benefícios previdenciários, cujo valor pode alcançar R$ 7.786,02. Na prática, a imensa maioria dos segurados urbanos ganha até dois salários mínimos. Cerca de dois terços. Já a totalidade dos segurados especiais, que ganham benefícios rurais, e dos titulares de benefícios assistenciais recebem um salário mínimo.
Embora a renda não defina a capacidade intelectual das pessoas, por detrás desse contingente estão analfabetos e vulneráveis sociais. Como a matéria previdenciária é cheia de meandro e mutante, até o homem médio tem dificuldade de dominá-la.
Justamente pelo fato de o INSS ter uma clientela em sua predominância carente e carecedora de informação, a legislação determina que servidores públicos têm o dever de orientá-los. Portarias, leis e normas internas apontam para o dever de orientar e dar ciência ao requerente acerca de situações que possam, de alguma forma, impactar na análise do seu requerimento, bem como oportunizar o saneamento do seu processo, com cartas de exigências. Mas como orientar se falta servidor?
Em tempo de modernidade, a administração do Instituto tem primado no uso de tecnologias avançadas, como inteligência artificial, atendimento remoto e análise de dados. Tornaram-se aliados nas análises automáticas e redução das filas.
Basta um clique no Meu INSS para iniciar o pedido. Se antes o atendimento no posto já era precário, agora nem mais isso. Os segurados se limitam a ler algo na internet, falar com um terceirizado na central 135 e se aventuram no pedido via celular. Tirar dúvida na agência é algo raro.
Esse requerimento administrativo muito provavelmente será avaliado por um robô, veloz e implacável. Em auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União, seis em cada dez pedidos de benefício lidos pelos robôs são negados. Quando não nega, o benefício sai com valor inferior. Cerca de 70% dos casos analisados as decisões automáticas desconsideraram pendências existentes no CNIS do beneficiário, capazes de aumentar a aposentadoria.
Todas essas mazelas do INSS agora estão na mira dos ministros do STJ. O Tema 1124 será uma prova de fogo para a Corte Cidadã compreender que nem todo cidadão que a procura tem noção desse conceito, nem muito menos das armadilhas ocultas de um mero requerimento previdenciário.
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