Michael Viriato
Montar a aposentadoria é como planejar uma viagem longa. Antes de decidir se vai de carro, avião ou trem, é preciso saber para onde está indo, quanto tempo pretende ficar fora e quanto quer gastar. Parece óbvio, mas o erro mais comum dos brasileiros é justamente o contrário: embarcar em qualquer veículo com a placa “previdência”, acreditando que o destino está resolvido.
Existe uma confusão recorrente entre ter um plano de previdência e ter um plano para a previdência. A diferença é sutil no nome, mas gigantesca na prática. O primeiro é um produto financeiro com vantagens tributárias. O segundo é um projeto de vida —a estratégia concreta para garantir a renda desejada no futuro. Muita gente acha que está fazendo um bom planejamento só porque comprou o produto certo, mas é como comprar uma passagem aérea sem saber o destino, só porque o preço pareceu bom.
O plano de previdência pode ser uma excelente ferramenta, mas, sozinho, não é sinônimo de planejamento. Nem sempre é o melhor veículo. E nem todo o mundo precisa dele agora. Por exemplo, jovens no início de carreira, muitas vezes, estão mais focados em adquirir bens ou investir no próprio negócio. Travar parte do patrimônio em um produto de liquidez restrita pode atrapalhar mais do que ajudar.
Ainda assim, há exceções. Para quem declara imposto no modelo completo, o PGBL pode ser uma boa escolha desde cedo —não apenas como investimento de longo prazo mas como forma de reduzir o IR a pagar hoje. Nesse caso, a previdência já começa a fazer sentido, mesmo que o plano de vida ainda esteja sendo desenhado.
À medida que o tempo passa, a previdência privada ganha importância, especialmente o tipo VGBL, que pode ser um trunfo poderoso na sucessão patrimonial. Esse produto, para idosos, é um dos veículos mais eficientes para sucessão. Já vi críticas a gerentes e assessores que alocaram 50% do patrimônio de um cliente de 80 anos em previdência, como se isso fosse um erro. Mas, na prática, é o oposto. Quanto mais próximos estamos do fim da linha, mais faz sentido usar esse veículo.
Se alguém me dissesse que vai morrer amanhã, a recomendação seria clara: coloque 100% do patrimônio em previdência. Pode parecer exagero, mas pense no seguinte: esse simples gesto pode economizar meses de inventário e dezenas de milhares de reais em impostos e honorários advocatícios, além de evitar um desgaste emocional imenso para a família. Previdência, nesse caso, é alívio —não apenas financeiro mas emocional.
Hoje, a indústria de previdência oferece opções sofisticadas. Já é possível montar carteiras completas só com fundos previdenciários —embora muitos dos melhores produtos ainda estejam restritos a investidores qualificados. Ainda assim, isso não muda o essencial: a previdência privada é uma ferramenta, não um fim.
Todo o mundo precisa de um plano para a aposentadoria. Mas nem todo o mundo precisa embarcar agora num plano de previdência. O erro é acreditar que, ao adquirir o veículo, o destino está automaticamente resolvido. O verdadeiro planejamento começa com o mapa —não com a passagem comprada.
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