Yuri Rugai Marinho
É evidente que estamos vivendo os anos mais quentes já registrados e isso está totalmente relacionado com as atividades humanas no planeta. Mas, não bastasse esse problema, vivenciamos também momentos de imensa tensão geopolítica global, que estão inviabilizando o enfrentamento da crise climática. O clima não está bom.
Começo apontando o comportamento dos Estados Unidos: assim que assumiu a presidência dos EUA, Donald Trump retirou o país do Acordo de Paris, revogou mais de cem normas ambientais e incentivou a exploração de petróleo e gás natural. Adicionalmente, cortou o financiamento da Usaid (uma das principais agências de desenvolvimento do mundo), eliminando mais de 90% dos contratos e cerca de US$ 60 bilhões (cerca de R$ 341 bilhões) em assistência externa.
Trump também estrelou um espetáculo assistido pelos 8 bilhões de moradores do planeta: o sobe e desce de tarifas de importação. Os EUA aumentaram suas tarifas contra praticamente todos os países do mundo, embora depois tenham recuado, provavelmente em razão da recessão global que viria como resultado.
Na Alemanha, terceira maior economia e uma das principais financiadoras de soluções climáticas no mundo, o governo iniciou uma revisão de suas prioridades e passou a investir na remilitarização do país. Em março de 2025, aprovou um fundo especial de 500 bilhões de euros para fortalecer sua infraestrutura militar. O pacote é uma reação à crescente insegurança gerada na Europa pelo conflito entre Ucrânia e Rússia, que se estende desde fevereiro de 2022.
Nesse cenário, qual é a condição real de uma discussão séria e comprometida sobre mudanças climáticas?
Nos últimos dois anos, o Fórum Econômico Mundial tem apontado, em seu relatório “The Global Risks Report” (relatório de riscos globais), que conflitos armados e questões climáticas são os maiores desafios atuais da humanidade. Isso significa que todos os países deveriam estar focados no enfrentamento dessas questões.
Em novembro de 2024, lideranças globais se reuniram em Baku (Azerbaijão), realizaram a COP29 – encontro anual dentro do sistema da Organização das Nações Unidas entre os países signatários da Convenção do Clima– e assumiram o compromisso de disponibilizar ao menos US$ 300 bilhões (R$ 1,7 trilhão) por ano, com a intenção de subir este valor até US$ 1,3 trilhão (R$ 7,4 trilhões).
Poucas semanas depois, no entanto, já no início deste ano, grandes bancos como Bank of America, Citi, Goldman Sachs, Wells Fargo, Morgan Stanley e JPMorgan se retiraram da Net Zero Banking Alliance (NZBA), a maior coalizão global de instituições financeiras comprometidas com a redução de emissões de carbono.
A gestora BlackRock –líder global na agenda ESG, com mais de US$ 11 trilhões (R$ 62,5 trilhões) sob gestão– anunciou a saída da Net Zero Asset Managers (NZAM), aliança composta por gestores de ativos internacionais comprometidos em apoiar metas e investimentos alinhados com emissões líquidas zero de GEE até 2050 ou antes.
Aqui no Brasil, o risco de inflação e a alta taxa de juros (com a Selic a 14,25% ao ano) não apenas deixam o governo com baixa popularidade como, também, reduzem o potencial de investimento em atividades de enfrentamento às mudanças climáticas e questões básicas da economia doméstica.
Quem tem se destacado positivamente na agenda climática é a China. O país, que já foi visto como um dos grandes vilões do clima, tem assumido compromissos climáticos mais consistentes, conforme demonstram suas contribuições nacionalmente determinadas (NDCs, na sigla em inglês) apresentadas à ONU, no âmbito da Convenção do Clima.
O país se comprometeu a atingir o pico de emissões de dióxido de carbono antes de 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2060. Planeja aumentar significativamente a capacidade instalada de energias renováveis, como solar e eólica, para reduzir a dependência de combustíveis fósseis. Pretende melhorar a eficiência energética em setores chave como indústria, transporte e construção. É um dos principais investidores em sumidouros de carbono com programas de reflorestamento e conservação de ecossistemas.
O clima não está bom e precisa melhorar. A COP30, que será realizada em Belém neste ano, pode ficar apagada em meio a toda a tensão geopolítica global. Não podemos esperar nada dos Estados Unidos.
Precisamos de uma COP de implementação, um encontro focado na execução prática dos acordos e compromissos climáticos já estabelecidos, sem a necessidade de rediscussões ou revisões. Os ajustes do Acordo de Paris e todos os estudos produzidos desde 2015 seriam suficientes para o enfoque em resultados e necessidades práticas.