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15/03/2025

A instabilidade não é de hoje – 07/12/2024 – Marcos Lisboa

O Brasil tem um histórico de alta volatilidade nos preços dos ativos, como taxa de câmbio, em comparação com a média dos países emergentes. O mesmo ocorre com os indicadores de atividade econômica.

Entre 1980 e 2019, o Brasil teve 26 anos de bom crescimento econômico, com a renda por habitante aumentando, em média, 2,8% anuais. O país teve igualmente 14 anos de queda da renda por habitante, em média, 2,6%.

Esses números destoam do que ocorre nos países desenvolvidos e emergentes. Esses países apresentaram redução da renda por habitante que variam de 0 a 7 anos no mesmo período. Nesses casos, a queda foi bem menor do que no Brasil, em média 1,7% nos países ricos e 0,3% nos demais em desenvolvimento, segundo dados do Banco Mundial.

O resultado foi um Brasil que cresceu menos do que os países ricos e bem menos do que os principais emergentes.

Essa constatação, contudo, encobre realidades diversas no Brasil. O agronegócio tem tido um desempenho impressionante desde o começo da década de 1970, com crescimento médio da produtividade em cerca de 3% ao ano, concomitantemente à queda dos preços dos alimentos e ao aumento significativo das exportações.

Existem outros casos de sucesso, como áreas de ciência da computação e de novas tecnologias, que despontam em vários centros do país.

As boas histórias têm algo em comum. Elevado investimento em formação de pessoas na fronteira do conhecimento, em geral impulsionado por políticas públicas bem desenhadas. Além disso, as regras do jogo devem incentivar o empreendedorismo, que colhe os benefícios dos sucessos, mas que devem arcar com as perdas em caso de revés.

Por outro lado, as muitas histórias de fracasso de políticas setoriais também sugerem aspectos comuns. O Estado é frequentemente capturado por interesses privados, que extraem subsídios e proteções para garantir suas rendas.

O reduzido acesso às melhores técnicas disponíveis no exterior, a pouca escala do mercado local e o baixo investimento em capital humano resultam em métodos pouco eficientes de produção e um setor privado sempre carente da renovação das benesses do poder público.

A inconstância de um país que ora parece decolar, ora condenado ao baixo crescimento se traduz no nosso elevado prêmio de risco. Como se não bastasse, há grande incerteza sobre aspectos que são comezinhos em outros países, como a segurança jurídica dos contratos, ou as normas tributárias e suas interpretações.

Uma componente desse processo de altos e baixos é o comportamento das contas públicas. Nos bons momentos, são concedidos subsídios para o setor privado, fortalecidas as empresas estatais e expandidas as políticas públicas usuais.

Nas fases difíceis, contudo, esse gasto dificilmente pode ser reduzido. Salários e aposentadorias, de longe a maior parte do gasto público, não podem ser diminuídos, e servidores têm a sua estabilidade garantida em lei. A política fiscal aumenta a amplitude dos ciclos econômicos, em vez de atenuá-los.

A baixa poupança doméstica, do governo e do setor privado, torna o país dependente de recursos externos, em parte atraídos por nossas altas taxas de juros, o que agrava ainda mais a volatilidade dos mercados.

A retórica recorrentemente denuncia os subsídios (gastos) tributários. Mais fácil falar do que fazer, como revelam os últimos anos.

Desde a transição para o atual governo, o gasto público cresceu R$ 345 bilhões.

A opção foi por aumentar as receitas, mas medidas aprovadas com o apoio do governo garantiram que as despesas obrigatórias também se expandissem.

A elevada, e crescente, dívida pública, que deve aumentar entre 12 e 14 pontos percentuais do PIB no atual governo, revela a consequência negativa desse processo.

O susto da semana passada foi mais um evento nessa trajetória repetida. Houve elevação da taxa de câmbio e dos juros de mercado.

O culpado, segundo muitos analistas, foi a timidez do ajuste fiscal em conjunto com o aumento da isenção do Imposto de Renda, que seria compensada pela maior tributação dos grupos de renda mais elevada.

O Brasil precisa de um ajuste fiscal recorrente, aumento da diferença entre receita e despesa anual, de cerca de R$ 300 bilhões para estancar o crescimento da dívida pública como proporção do PIB.

A equipe econômica anunciou cerca de R$ 30 bilhões no primeiro ano e R$ 40 bilhões no segundo. Ainda que tímido, o anúncio teve o mérito de enfrentar temas até então difíceis para o atual governo. Mas faltaram detalhes técnicos, incluindo as memórias de cálculo, o que levou à incerteza sobre o impacto das medidas.

As propostas de isenção do Imposto de Renda e da maior tributação sobre as pessoas com maior renda foram tumultuadas, não só pelo momento mas também pela falta dos detalhes de implementação.

As estimativas sobre o custo da isenção, por exemplo, oscilam entre R$ 40 bilhões e mais de R$ 50 bilhões, a depender dos detalhes, para ficar em um só item dos muitos anúncios.

A temperatura subiu. Muitos investidores confiaram nas promessas do começo do governo de que iria equilibrar as contas públicas e aportaram recursos no Brasil, apostando que as taxas de juros cairiam e que a taxa de câmbio não subiria. Deu errado.

O resultado foi uma imensa perda nos fundos multimercado, como relatei na coluna de 4 de julho. Em outubro, escrevi nesta Folha que estava tudo bem na economia, até então. Mas que os sinais eram preocupantes.

Segundo dados da B3, em 2023 entraram quase R$ 45 bilhões de investimento estrangeiro no mercado de ações. Neste ano, saíram até agora mais de R$ 33 bilhões. Apesar do elevado nível histórico de investimento direto estrangeiro no Brasil, o volume de novos recursos, excluídos os lucros reinvestidos, oscila, mas, em média, caiu nos últimos anos.

No leilão do Tesouro de terça-feira (3), o título NTN-B 2027 foi vendido a inflação, IPCA, mais 7,33% de juros reais. No caso de um título mais longo, NTN-B 2045, os juros reais chegaram a 6,91%, quando em janeiro deste ano estavam perto de 5,7%.

Investimento é obra de longo prazo. Requer confiança nas escolhas de política pública e nas regras que organizam o setor privado. Ainda é possível corrigir o rumo. Afinal, a atividade avança bem e o desemprego está baixo. Mas o tempo está passando, e o governo continua refém das suas contradições.



Fonte: Folha UOL

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